sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Capítulo 6: Sábado, dia de morrer


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(Leia ouvindo Jose Gonzales, Down the lie, clicando acima)

Ficar sozinha naquele sábado seria o mais lento, o mais torturante tipo de morte. Não depois daquele telefonema. Não depois de tantos sábados sem Jairo. Não depois de ser ela com ela mesma fim de semana após fim de semana.
Não essa morte tranqüilizadora, suave, que em questão de segundos tudo acaba e você vira nada.
Um outro tipo. Uma morte maldita que antes do ato final te obriga a pensar em tudo, em olhar pra sua vida ali nos seus pés e ter que cutucar cada ferida, esmiuçar a dor.
Ela não podia ter outro sábado doloroso. Não deveria se sentir tão atingida assim.
Era nessas coisas que ela pensava enquanto Pablo estava na fila do banheiro no restaurante lotado de gente aparentemente feliz. Tinha sido ótimo ligar pro seu amigo animado. Seu amigo de alma feminina que a entendia tanto. E lá estavam agora. Na fila. Modernos, descolados, puro clichês. Eram assim. Estavam assim. Curtindo a vida.
- Essa fila me dá um pouco de preguiça, disse Pablo enquanto se sentava de frente pra ela e de costas pra porta.
Dora via sobre o ombro dele jovens em pé com copos de cerveja na mão, na porta do restaurante. Eles estavam contra o sol. E a luz estava linda.
- Eu gosto bastante daqui... murmurou Dora e deu de ombros com um meio sorriso. Acho bonito.
- A figuração tá ótima! Pablo riu enquanto enchia seu copo de cerveja.
Eram quatro e meia da tarde eles estavam almoçando na Benedito Calixto, a praça que Dora adorava ir com o Pablo. Na companhia dele a praça tinha outro sentindo.
Eles haviam passado a manhã na piscina, bebendo cerveja, falando sobre coisa nenhuma. Pablo não perguntou nada, quis deixar a amiga a vontade e ela sentiu a vontade de não tocar no assunto Jairo.
Pelo menos não naquele momento. Não ali.
_ Jairo me ligou. Dora disse bebericando a cerveja e empurrando o guardanapo na mesa com a outra mão.
- E aí? O que ele queria?
-Disse que ta com saudade, que quer me ver.
-Afff! que escroto! Desencana né amiga! Nada a ver... você não precisa disso...
- Queridinha! Disseram os dois ao mesmo tempo em voz alta.
- O cara é um escroto Dorinha!
- Eu sei... Fiquei mexida... eu ainda gosto.. sei lá...
- Ele é um egoísta! Ele só tá pensando nele, ele até pode estar com saudade, mas ele não te ama mais, nunca amou,Vocês vãos e ver... transar e ai? Ai ele vai sumir
deixa morrer isso meo!
-Eu sei... enfim... sei lá Pablo to estranha, infeliz... me sinto triste sabe... sei lá... as vezes parece que eu perdi minha inocência, minha fé...
- Não viaja! O mundo é lindo e sombrio... Por Favor né Dora... sai dessa, canaliza pra outra coisa...acho que você ta fumando muito, amiga.
- O quê? maconha? Nem tô.
-Não! só hoje na piscina nós fumamos três... e ainda tem o digestivo.
Dora riu, Pablo também. E era isso que Dora precisava naquele sábado. Precisava ficar "desligada", relaxar esquecer um pouco a semana. E Pablo? Pablo tinha o dom de faze-la rir.
- Amiga! Acabei de ver meu peguete de ontem!, exclamou alto Pablo, enquanto a menina continuava absorta em si mesma.
Sim... Outra semana. “Vem outra novinha aí!”, dizia mentalmente ela para si, se enganando, fingindo que tinha esperança numa nova semana e que naquela tudo seria diferente,
Fingia que algo aconteceria naquele inércia do mundo. E então como se fosse uma personagem de teatro fingia acreditar em um novo dia.
Afinal, não era isso que todo mundo fazia? Era! E ela conseguiria repetir a peça toda novamente? Não sabia... mas ao menos, naquele final de sábado de tarde, por algumas horas, ela esqueceria, ela esqueceria aquele enredo ruim, aquele livro de quinta que era sua vida.
Ela viveria naquele final de tarde.
Continuaria. E como se esses pensamentos todos lhe tomassem por inteiro ela não fora capaz de ver a cena logo ali à sua frente. Mergulhada na sua tristeza, mergulhada no seu mundo estático Dora só percebeu que algo acontecia quando ouviu aquele som estridente, aquele som que lhe lembrava... Um disparo?

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