sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Capítulo 2, episódio: Jairo

Fez o caminho inverso na hora de voltar pra casa, mesmo metrô linha verde. O metrô era a coisa que ela achava mais civilizada em São Paulo.

Estava exausta. Trabalhava como recepcionista em uma galeria de arte de um artista plástica gente boa, apesar de ser formada em radio e tv e de ter trabalhado durante anos em uma grande emissora de televisão. Abandonara a carreira ao completar 29 anos e há um ano trabalhava naque espaço.

Havia entrado em um projeto de mudança de vida, mas como todos os outros não tinha levado adiante. Ela achava dificil mudar hábitos aos trinta, e o seu maior era desistir antes mesmo de começar.

O metrô estava lotado naquele fim de dia e ela com preguiça de ler. Enquando o trem avançava sobre o escuro, ela pensava que tinha preguiça de estar viva, estava mais cansada que o habitual. Tinha tido um dia difícil na galleria, mas o pior de tudo foi ter sido tomada de surpresa por uma lembrança. Uma lembrança que a perseguia com mais freqüência nesses últimos dias.

Ela se lembrou de Jairo. De seu sorriso, seu jeito de tomar cerveja com limão e sal, o jeito que sentava com as pernas cruzadas de um jeito estranho, ocupando muito espaço. Sim, Jairo era espaçoso, pensou e expressou um meio sorriso que passou desapercebido por quem viajava ao seu lado. Jairo, Jairo, Jairo. Embora não quisesse não conseguia deixar de pensar.

Pensava na gentileza dele, do beijo, de como ele a tocava e de como a tinha deixado completamente perdida e sem rumo depois daquela manhã fatídica em que ele fora embora levando tudo, inclusive sua paz. Nem se lembrava como era sua vida antes de.

Desceu na Trianon Masp, Paulista lotada pra variar. Entrou na rua das Flores e seguiu pro seu prédio. "Dia de cão!" repetia enquanto sua mente era invadida pelos olhos de Jairo. Pelo cheiro de Jairo. Odiava-o com todas as forças de sua alma. E quando atravessou a entrada do prédio, e esperava o velho elevador descer rangindo os dentes, sentiu um nó na garganta e uma aflição no coração. Parecia que ia morrer a qualquer momento. Suas mãos suaram e ela recebeu sua companheira constante em noites como aquela, aquela tal tristeza que ela definia como amarga e descia pela garganta se espalhando pelo corpo todo com uma rapidez desnecessária. Passou a língua ao redor dos lábios e reconheceu: era o gosto do fracasso.

Tomou o elevador e deu um passo rumo ao seu mundo.

O apartamento era modesto. Em um prédio antigo sem porteiro nos arredores do Masp, boa localização diziam os amigos. Comprara antes dos trinta, devia se orgulhar. Não se orgulhava. Sentia até um certo arrependimento. Poderia ter viajado com o dinheiro, ser do mundo, errante. Podia ser mais corajosa, não era. Deixou a bolsa no sofa, tirou os sapatos e os deixou caídos na sala. Malditos saltos!

O sol se punha, o barulho do trânsito infernal. Abriu a geladeira, duas cervejas. Abriu uma tomou um gole, desceu amarga, aliviando a garganta. Queria um vinho branco não tinha. Pensou em fazer um baseado, desistiu. Assim na frente da geladeira segurando a porta aberta pensou que era uma desgraçada por não ter o vinho. Patética, sentiu vontade de chorar. Não pelo vinho mas, por tudo. Aquele amontoado de clichês que era sua vida.
O inferno… pensou enquanto fechava a geladeira e se sentava no chão para beber a cerveja que ela nem mesmo gostava, o inferno são os trinta!
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2 comentários:

  1. Preciso me corrigir... a "menina" não é rabugenta (como comentei no cap. anterior), ela é angustiada. To curiosa pra ler o próximo cap.

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  2. Todo dia venho ver se já saiu o 3º capítulo. Ansiosa e curiosa!

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a menina quer te ouvir...